domingo, 1 de junho de 2014

Basta de fingir


Artigo para O Globo 30/5/2014

*Por Cristovam Buarque

O Brasil comemora sua posição de sétimo maior PIB do mundo, mas o PIB per capita rebaixa o país para a 54ª posição no cenário mundial; no IDH (Índice de Desenvolvimento Humano) ficamos em 85º lugar. Fingimos ser ricos, apesar da pobreza.

Nos últimos 20 anos, passamos de 1,66 milhão para 7,04 milhões de matrículas nos cursos superiores, mas quase 40% de nossos universitários sabem ler e escrever mediocremente, poucos sabem a matemática necessária para um bom curso nas áreas de ciências ou engenharias, raros são capazes de ler e falar outro idioma além do Português. Fingimos ser possível dar um salto à universidade sem passar pela Educação de Base.

Comemoramos ter passado de 36 milhões, em 1994, para 50 milhões de matriculados na Educação Básica, em 2014, sem dar atenção ao fato de termos 13 milhões de adultos prisioneiros do analfabetismo; 54,5 milhões de brasileiros com mais de 25 anos não terminaram o Ensino Fundamental e 70 milhões não terminaram o Ensino Médio. Fingimos que os matriculados estão estudando, quando sabemos que passam meses sem aulas por causa de paralisações ou falta de professores.

A partir de 1995, no DF e em Campinas, iniciamos um programa que serve de exemplo ao mundo inteiro, atualmente chamado de Bolsa Família e que transfere por mês, em média, R$ 167,00 por pessoa pobre, o que lhe assegura R$ 5,67 por dia, valor insuficiente para aliviar suas necessidades mais essenciais. E fingimos que, com esta transferência, estamos erradicando a pobreza que é caracterizada efetivamente pela falta de acesso aos bens e serviços essenciais que não estamos oferecendo. Fingimos ter 94,9 milhões na classe média, sabendo que a renda média mensal per capita dessas pessoas está entre R$ 291 e R$ 1.019, quantia insuficiente para uma vida cômoda, especialmente em um país que não oferece educação e saúde públicas de qualidade.
Comemoramos o aumento da frota de automóveis de, aproximadamente, 18 milhões, em 1994, para 64,8 milhões, em 2014, fingindo que isto é progresso, mesmo que signifique engarrafamentos monumentais.

Comemoramos, corretamente, termos desfeito uma ditadura, esquecendo que a democracia está sem partidos e a política se transformou em sinônimo de corrupção. Fingimos ter uma democracia com liberdade de imprensa escrita em um país onde poucos são capazes de ler um texto de jornal. Assistimos 56 mil mortos pela violência ao ano, e fingimos ser um país pacífico, sem uma guerra civil em marcha.

Fingimos ser um país com ambição de grandeza, mas nos contentamos com tão pouco que os governantes se recusam a ouvir críticas sobre a ineficiência dos serviços públicos. Preferem um otimismo ufanista, comparando com o passado que já foi pior, e denunciam como antipatriotas aqueles que ambicionam mais e criticam as prioridades definidas e a incompetência como elas são executadas. Antipatriota é achar que o Brasil não tem como ir além, é acreditar nos fingimentos.
*Cristovam Buarque é professor da UnB e senador pelo PDT-DF

3 comentários:

  1. Excelente análise! Principalmente no momento em que vivemos, onde pessoas compartilham, nas redes sociais, que querem que os turistas que vêm para a copa vejam um Brasil lindo. Essa ilusão toda nos servirá de alguma coisa? Desconfio desse otimismo todo, e concluo com a fala muito pertinente de Pondé, quando diz que: "O pessimismo funciona como um controle de qualidade, uma avaliação de tudo que o ser humano faz. O ser humano demasiadamente otimista torna-se arrogante e super confiante, o que diminui sua vigília e aumenta a chance do fracasso".

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    1. Obrigada Carla.
      E além de tudo o que você muito apropriadamente mencionou, podemos ver o quanto a opinião publica é enganada pelas falsas informações. Eles fingem e nos acreditamos nas mentiras.

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  2. Cristóvão Buarque foi ministro do governo Lula do qual foi exonerado por incompetência. Não se reelegeu ao governo do DF derrotado que foi pelo corrupto Roriz.Tem magoa do PT e Lula.Os institutos de pesquisa e estatística são apartidários.Todos estão carecas de saber que O PIB já não serve para auferir o tamanho da riqueza nacional e muito menos o PIB per capta.Isso já foi constatado por todos desde o"início dos tempos".Fala de mazelas seculares na educação, etc, deixando de dizer que o governo do PT propôs a destinação de 10% dos recursos do pré-sal para a educação PÚBLICA.O governo não diz que "erradicou a pobreza".O governo fez uma projeção para erradicar a pobreza. O governo divulga, sim, os resultados obtidos para a erradicação da miséria absoluta aonde fomos atirados por governos de partidos que ele se alinha da bancada de oposição.O que "sugere"de alternativa com o fim da presença das m ontadoras de automóveis no Brasil, dado o peso desse segmento industrial na economia?Fala como homem da elite burguesa quando afirma, como toda a razão,que estão sem partido devido.Deixa de dizer que isso se deve aos desastrosos governos de direita,desde a ditadura civil-militar, passando por sarney, collor e fhc.A burguesia de direita só conta com a globo que não é partido político. Tem esperanças de que a globo coloque um segundo cocainômano na presidência. Não existe otimismo nem patriotada nos governos do PT.Isso é uma declaração boçal.Deprimente. Cristóvão Buarque é um magoado e fala do governo do PT por despeito. O pior é que sempre foi desonesto intelectualmente e desafinado com os desejos da massa trabalhadora que constrói o novo Brasil e que, com Lula e Dilma, governa para todos os brasileiros.

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